As casas, antes só no reboco, ganharam cores. Latas de tinta verde, rosa, amarelo e pêssego foram distribuídas pela prefeitura aos moradores da cidade de 35 mil habitantes às margens da BR-226, que liga Natal ao interior do estado. Mutirões de limpeza foram organizados e faixas, espalhadas pelas ruas: “Alto de Santa Rita, um sonho que se aproxima”. Parecia mesmo impossível surgir, em pleno sertão nordestino, um monumento maior que o Cristo Redentor, no Rio de Janeiro, e a Estátua da Liberdade, em Nova York (Estados Unidos). A maioria da população de Santa Cruz e dos arredores nunca viu de perto os “adversários”. Mas já estava até desconfiada de que, lá no alto do morro, seria mesmo erguida a prometida imagem da santa das causas impossíveis. Três anos depois, fiéis e curiosos peregrinam, antes da inauguração oficial, marcada para amanhã, só para ver bem de perto a madrinha do sertão.
Com 56 metros, Santa Rita de Cássia carrega na mão direita uma cruz de 10 metros e, na esquerda, um resplendor de sete toneladas. Tem mais que o dobro de tamanho da estátua de Padre Cícero, localizada em Juazeiro do Norte, Ceará, símbolo da fé nordestina. De qualquer ponto da cidade é possível avistar a imagem. Da estrada, chama ainda mais atenção. E lá do alto, se vê ao longe um rio, vales e nenhum sinal de civilização, tirando as poucas casas da cidade, que agora formam um verdadeiro arco-íris. Santa Cruz, fundada em 1825, está a 110km de Natal e fica distante de qualquer outro centro urbano. Em outros tempos, foi chamada de Santa Rita da Cachoeira e, depois, de Vila Trairi, por conta do ribeirão que passa por ali. Porém, os moradores sempre foram fiéis na devoção à santa. A primeira capela da cidade foi dedicada à padroeira. A imagem veio do Ceará.
O complexo turístico religioso foi ideia do ex-prefeito Luiz Antônio Lourenço de Farias, o Tomba, e dos padres da cidade. O escultor Alexandre Azedo, que projetou o memorial de Frei Damião, na Paraíba, foi convocado para a missão. Com recursos do governo do estado e do Ministério do Turismo, a imagem da santa saiu do papel. Custou R$ 3.774.063,76. A obra ficou nove meses parada. O Ministério Público Estadual (MPE) questiona a relevância do projeto para o município. Segundo o inquérito, a prefeitura mal tem recursos suficientes para a manutenção da infraestrutura básica do município.
Megalomaníaco
Com uma capela, sala de promessas, praça do romeiro, auditório, restaurante, lanchonete, lojinhas, mirante e um amplo estacionamento, casas tiveram que ser desapropriadas para a construção do complexo. Antes da obra megalomaníaca, a festa de Santa Rita, em 23 de maio, já atraía cerca de 120 mil pessoas para a cidade. Agora, os moradores acreditam que Santa Cruz dará um salto no desenvolvimento. Juscilene Silva, 24 anos, fez sua parte. Preparou a casa para a festa de inauguração. Pintou a fachada com a tinta que o prefeito entregou e limpou o terreno. “Vai vir muita gente para a cidade. A santa vai aumentar o turismo.” O atual chefe do Executivo municipal, José Péricles Farias da Rocha, primo de Tomba, comprou a ideia. Acredita que vai transformar o município no novo roteiro de peregrinação religiosa nordestina, assim como ocorre em Juazeiro do Norte.
“Sempre fui devota de Santa Rita. Vim ver a imagem. É grande demais”, conta a dona de casa Luciene Miranda, 28 anos, que, na quarta-feira da semana passada, subiu o morro pela segunda vez. A primeira foi quando a obra ainda estava começando. Prepara-se para fazer o caminho, de aproximadamente três quilômetros, de novo esta semana. Ficou sabendo que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva viria para a inauguração. A Presidência ainda não confirma a agenda, mas Luciene não se importa. “Venho de qualquer jeito para pedir saúde para os meus filhos.”